segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O nosso aniversário é feito de agradecimentos.


Há alguns dias, o Ativismo de Sofá fez um ano de sua primeira publicação. Durante esse tempo, a gente percebeu que é complicado manter uma frequência de posts, a gente percebeu que nem sempre é possível ter paciência e tempo para participar dos debates nos comentários, muitas vezes a gente estará desgastada demais para escrever sobre assuntos que consideramos pertinentes e a gente percebeu o quanto nossos leitores e comentaristas tem a oferecer.

Mas o mais importante é notar como o blog acrescentou para nós. Nós aprendemos muito com as outras amigas e colaboradoras do blog, com os debates que tivemos nas elaborações de alguns textos, com a leitura de notícias e também com a troca de desabafos, casos, experiências e opiniões.

Provavelmente o melhor de todo o tempo de blog não é visível a todos, mas somente às colaboradoras e aos que convivem muito com elas. O blog nos permitiu estreitar nossos laços, aumentar a liberdade entre nós, dar mais chance para aprendermos umas com as outras e intensificar nossas trocas. Nós já mencionamos isso aqui, mas sempre é bom relembrar: tudo começou a partir de uma amizade de orkut. Somos as "MqNSP", abreviação para "mulheres que não sabem provocar". Nos unimos por saber que havia algo de muito errado no mundo. A Natália, participante da comu, nos deu a palavra que denomina exatamente qual é o problema: patriarcado.

MqNSP <3
A partir daí nós seguimos compartilhando idéias, experiências, leituras, inquietações. Várias meninas seguiram seus caminhos, algumas discordaram veementemente de nós (o que não quer dizer que não discordamos entre nós) e se foram, mas nós e a nossa amizade acabou perdurando. E o blog é resultado disso. Portanto, a gente agradece também a todas as "MqNSP", por terem ensinado a todas nós o que é sororidade na prática. Especialmente à Gizelli, que colaborou conosco, fez parte do blog e foi fundamental para o Ativismo de Sofá.

Os debates com os leitores nos comentários, apesar de às vezes serem fonte de impaciência, foram muito acrescentadores. Ver os textos sendo compartilhados nas redes sociais nos fizeram sorrir, afinal, a gente escreve pra ser lido, né? Ver a intensa participação do projeto de envio de fotos "Free pussy riot", que conquistou participação suficiente para até sermos entrevistadas, foi emocionante! 

Hoje é um dia para agradecer a todos que nos apoiam, nos leem, compartilham suas opiniões aqui no blog e queremos agradecer especialmente a todos que nos confiaram seus textos para guestpost. Taís Fantoni, Henrique Marques-Samyn, Cintia Farias, Natália Schmidt, Laís Rangel, Augusto Salla, Lídia FreitasAna (que não fez um guestpost propriamente dito, mas o comentário dela virou post) e a anônima e amiga que utilizou esse espaço pra denunciar a violência contra a mulher no transporte público, obrigada.

Escrito por Thaís e Flávia.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Beyoncé Feminista. E poderosa.

O texto que vos apresento abaixo está longe de ser uma unanimidade. Eu mesma confesso que nunca pensei na Beyoncé como um "grande ícone feminista". Tenho mudado de idéia. Principalmente por ter visto a última apresentação da diva, e pela leitura do texto abaixo, que traduzi com o intuito de postar aqui. E também pela leitura desse outro texto aqui (em inglês). 

Para contextualizar: o artigo trata, basicamente, da apresentação bombástica que a Beyoncé fez durante o intervalo do jogo de abertura do Super Bowl. Uma explicação rápida acerca do que é o Super Bowl se encontra aqui.

O nosso intuito, ao trazer esse texto para vocês, é estimular um debate a respeito. Eu, Flávia, acredito ser muito importante que mais e mais pessoas famosas se assumam feministas. Mesmo que elas se contradigam volta e meia, ou frequentemente, eu acho crucial que tenhamos mais visibilidade. E mais irmandade, afinal, ninguém está livre de contradições. Eis:




Imagem retirada da page do Machismo Nosso de Cada Dia, no Facebok
"Se o que você viu foi uma cantora vendendo sexo às massas em um figurino minúsculo, deixe-me dizer que você viu o que você queria ver.

Se o que você viu foi uma exposição ofensiva, inapropriada e hipsersexualizada de pernas e outras partes mal-cobertas, deixe-me sugerir que você viu apenas o que você estava  encarando, não o que realmente aconteceu naquele palco.

Se o que você viu foi uma artista levando homens (e mulheres) por toda a América a cometer o pecado da luxúria em seus corações, você perdeu o ponto totalmente.

Porque a performance da Beyoncé domingo passado em Nova Orleans não foi sobre sexo. Foi sobre poder, que a Beyoncé teve em abundância. Na verdade, o show dela foi uma das mais constrangedoras, encorpadas e proféticas demonstrações de poder feminino que eu já vi na televisão mainstream.

O fato de uma mulher negra ter se afirmado e se apropriado do seu poder durante essa celebração misógina e consumista conhecida como o Super Bowl realçou a bravura e o brilhantismo da mesma. Não é de admirar que as pessoas tenham tentado retomar o controle dela e de seu corpo ao marginalizar e sexualizar a sua performance.

A Beyoncé estava atraente, sexy? Certamente. Mas, mais do que tudo, ela estava poderosa. Poucas coisas são mais ameaçadoras à audiência masculina do que uma mulher bonita e poderosa que não precisa de um homem, nem mesmo de um olhar masculino.


Talvez os amigos não notaram conscientemente que não havia sequer um homem no palco. Durante aqueles poucos minutos, não houve vozes masculinas e nem corpos masculinos no controle, apenas mulheres que se recusaram a ser apropriadas. E não se tratava apenas de muheres dançando lá em cima, apesar do foco das câmeras ter sido basicamente nisso. As mulheres no palco estavam criando, tudo. Elas se apropriaram de imagens tradicionais masculinas e as transformaram em femininas - não apenas imitaram os homens. Elas estavam reinvindicando papéis e instrumentos tradicionalmente ligados a homens: os chavelhos e os saxofones, o solo pirotécnico de guitarra.  


Elas foram ferozes, mas se negaram a se masculinizar ou a se objetificar.
Parte de meus amigos zombaram da Beyoncé, postando insultos como " pior intervalo de show de todos os tempos" ou "tirem essa porcaria desse projeto de música do meio do campo". Teve um que simplesmente rotulou toda a apresentação como "Peitos do Sul Selvagem", um sofisma decididamente racista e sexista.

A resposta das minhas amigas foi marcadamente diferente. Uma exclamou, "o corpo dela é maravilhoso! Eu adoro como ela é encorpada! Eu quero aquele corpo e aquela energia!" O corpo da Beyoncé é importante - não porque é hipersexualizado - mas porque se tratava apenas de um corpo de mulher, não de um corpo de mulher esculpido para um homem.  

Então aqui, no meio dos comerciais e de uma cultura que objetificava as mulheres e seus corpos e no meio de um espetáculo esportivo que constrói poder em termos de violência, a Beyoncé começou sua performance derrubando a narrativa. Ao caminhar pelo palco, Beyoncé demonstrou mais poder em um punhado de passos premeditados e desafiadores que ambos os times durante todo o primeiro tempo. Em resumo, durante aqueles poucos passos, andando como uma mulher, a Beyoncé declarou posse daquele palco - daquele estádio - e, mais importante, reinvidicou posse de seu próprio corpo durante as mais misóginas e objetificantes quatro horas de cultura de massa.

É preciso ser guerreira pra conseguir fazer algo assim. Não foi de surpeender que na metade do show, a deusa guerreira hindu Durga apareceu, encarnada pela Beyoncé. Numa tela de pop-up, mãos emergiram e rodearam a Beyoncé por trás. Não se tratavam de mãos masculinas. Não eram as mãos de Justin Timberlake ameaçando despi-la em um "guarda-roupas defeituoso". Tratam-se das mãos dela e elas tentam abraçá-la, não para possui-la mas sim para expandir seu poder.

A imagem de Durga é a mais apropriada para a performance da Beyoncé. Durga, cujo nome significa um forte que não pode ser invadido. Durga, a mãe, a guerreira, a que protege do mal. Durga, a guerreira que luta contra demônios, e os vence.

Durante as duas semanas passadas, críticas foram disparadas à Beyoncé por dublar o hino nacional nas festividades de posse do presidente Barack Obama. Ela foi satirizada e descartada. Mas, domingo passado, a Beyoncé riu por último.

Quando as ex-integrantes do Destiny's Child deixaram o palco, a Beyoncé irrompeu em um poderoso número de dança. Naquele momento, parecia que ela estava dançando sobre o túmulo fresco do sexismo, da supremacia masculina, de todos os trolls que tentaram reduzi-la a qualquer coisa que não fosse bonita, talentosa, poderosa, qualquer coisa que fosse menos que uma mulher.

Foi uma dança de desafio.

E todas as mulheres do palco se juntaram a ela.

Não houve vergonha.

Beyoncé presenteou o mundo com a sua performance. Por 14 minutos, as mulheres não foram posse de ninguém. Ao invés disso, durante aqueles minutos poderosos e proféticos, a Beyoncé e as mulheres do palco se apropriaram da noite.

Naquela noite, os homens, a misoginia, a objetificaçao ou sexismo não venceram, ainda que tenham contado com a maior parte do tempo no ar.

Ao invés disso, graças à Beyoncé, as mulheres se apropriaram do Super Bowl XLVII."

* Texto de David Henson. Original, em inglês, aqui.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Por que espaços políticos exclusivamente femininos são tão necessários?


De Anna Grrrl.
Quando se fala em "espaços políticos exclusivamente femininos", a polêmica se instala. Mas os motivos dessa polêmica existir e sempre dar grandes debates em grupos e coletivos feministas é só mais um sinal de como essa espécie de grupo é necessária para a nossa militância.

Por que apoiar a existência de espaços exclusivamente femininos? Bom, quando a gente pensa nos espaços que compõem a nossa sociedade, a gente percebe que nós mulheres não sentimos a sensação de "pertencimento" e liberdade em nenhum dos espaços conhecidos. A rua "é" dos homens e eles sempre fazem questão de nos lembrar disso quando alguns deles nos assediam e nos fazem temer pela nossa integridade física/sexual. A escola/faculdade/trabalho são espaços públicos, assim como a rua, logo, de pertencimento dos homens. A casa costuma seguir os moldes da sociedade patriarcal e ter como líder dela um homem, mesmo que sejam as mulheres que limpem e a mantenham. Nossa voz tem menos valor em todos esses lugares. Espera-se nesses locais que a gente se comporte como nos foi ensinado: submissas, frágeis e quietas.
  
Se todos os espaços que conhecemos, mesmo que pareçam mistos, nos sentimos como intrusas, há algo bem errado, não? E é a partir dessa reflexão é que a gente deve começar a pensar na necessidade dos espaços políticos exclusivamente femininos.

Se homens e mulheres não têm espaços iguais na sociedade, pegar um espaço e fazê-lo unicamente feminino não fere a igualdade que o feminismo busca, porque se todos os outros espaços são masculinos e esse espaço feminino servirá pra fortalecer os laços entre as mulheres e construir um movimento de emancipação e libertação, não há ofensa. A existência de um espaço que """""exclui""""" a parcela dominante da sociedade é simplesmente um mecanismo das mulheres de saírem da situação de marginalização que a dominação masculina as colocou. 

Retirado daqui: Anna Grrrl - 
Tradução: Eu luto como uma garota.
O espaço político exclusivamente feminino não fere os homens e nem tem a intenção de fazê-lo. É simplesmente uma forma de auto-organização que é extremamente necessária para o movimento feminista. Vivemos em um mundo onde a voz da mulher não tem valor, onde não acreditam em amizade feminina verdadeira, onde tentam nos calar fazendo piadinhas sobre nossos papéis de gênero a cada momento que temos coragem de levantar a voz contra as opressões sofridas, onde o termo "mulherzinha" é considerado uma ofensa. E onde a presença masculina é opressora para as mulheres, por mais que o cara seja igualitário e nos respeite, nós fomos condicionadas a temer os homens e a nos calar frente a eles. 

Nós precisamos de espaços políticos exclusivamente femininos para que possamos juntas nos organizar para combater as opressões, para fortificar nossos laços com outras mulheres, aprendermos a ouvir as outras mulheres e digo até que a existência deles é importante para que a gente combata nossos machismos internalizados. Por que a gente precisa tanto pedir para que os homens participem de mais um espaço? Será que é porque a gente foi condicionada a sempre pedir "aprovação" para o que pensamos?  Esses espaços nos ajudam a nos emancipar, a construir uma autoestima independente de aprovação masculina, a aprender a amar outras mulheres e a bater de frente com todo nosso machismo e misoginia internalizados. 

Apoiar espaços políticos exclusivamente femininos não é ser excludente. Não é oprimir homens. Não é buscar privilégios. É simplesmente fortalecer nossa luta. E multiplicá-la. Afinal, apoiar esses espaços não é ser contra espaços mistos. É simplesmente querer somar aos espaços mistos outros espaços.

E termino esse texto dizendo que muitos dos argumentos utilizados a favor da defesa dos espaços femininos se aplicam também na defesa de espaços políticos exclusivamente para mulheres negras e/ou lésbicas. E a mesma lógica se aplica também quando trabalhadores e operários buscam um espaço para discutir suas idéias sem a participação dos patrões.

Recomendamos MUITO: "Separatistas são os homens", de Cely Couto. 

E também: "Guestpost: Feministas chatas e lugares de fala" de Lídia Freitas
 "Cultura do estupro no espaço público: Nosso direito de ir e vir ameaçado." da Gizelli Sousa. 
"Por que precisamos de espaços exclusivos?" - Blogueiras Negras, sobre espaços exclusivos para pessoas negras. 
E "Não pediremos: "por favor parem de nos oprimir"" de Thaís e Flávia. 

Imagens do tumblr Anna Grrrl.
Página do facebook: Anna Grrrl.