terça-feira, 2 de outubro de 2012

A mulher inteligente, segundo o patriarcado


Peço desculpas antecipadas pelo tema escolhido, já que a querida Paula Mariá já falou nesse post sobre a dualidade entre estética e sabedoria. Por isso, talvez eu caia no erro de me repetir um pouco. 

Dia desses, me vi num debate via twitter com algumas amigas sobre a questão "beleza versus inteligência". Uma relação antagônica e opressora que no fim das contas deseja nos calar, nos silenciar (como sempre). A questão é que desde crianças somos treinados para reconhecer apenas esses dois signos: A beleza e a inteligência, pois é comum os pais (e as pessoas em volta da criança) elogiarem a inteligência e a beleza delas, deixando de observar que existem outras características notáveis.

As mulheres, em especial, são cobradas pela beleza - e por "beleza", entenda "padrão de beleza" - desde cedo. Falo por mim e por outras, pois tenho certeza que não sou a única: minha primeira dieta foi por volta dos 10 anos de idade, assim que entrei na puberdade e ganhei algum peso. Fiz alisamento nos cabelos aos 12 anos. Me depilei pela primeira vez também com essa idade. Contudo, a beleza é uma via de mão dupla, pois ao mesmo tempo em que nos cobram beleza para participar minimamente de um sistema de sociedade castrador e machista, nos dizem que beleza não é o suficiente para que sejamos compreendidas como seres humanos, agentes de nossas vidas. A beleza nos põe ocupando a função que o patriarcado exige das mulheres: meramente decorativa. Não estou com isso tentando desvalorizar aquelas mulheres que são vaidosas, longe de mim, apenas estou explicando como se dá a cobrança por um padrão inatingível para muitas pessoas.

Exemplo de imagem que separa
mulheres em para pegar e para casar
No momento que nos damos conta de que ao mesmo tempo em que somos cobradas pela beleza, somos chamadas de fúteis, de vazias, nos exigimos o outro signo, o da inteligência. Só que a inteligência que nos requisitam e que é premiada nas mulheres não deveria ser chamada dessa forma. Quem por aí não se deparou com relatos sobre a figura mitológica da mulher para casar? A mulher para pegar é aquela cuja beleza é preponderante e a mulher para casar é aquela cuja ~~inteligência~~ , acompanhada de beleza ÓBEVEO, é essencial. Não faltam memezinhos na internet demonizando mulheres e que expressam essa diferença de tratamento. Contudo, a mítica mulher inteligente, da qual tratam as imagens, só é chamada assim quando o seu pensamento se alinha ao pensamento masculino, ao pensamento daquele homem que se interessou por ela. Mulher inteligente, aos olhos de muitos homens, é aquela que não o questiona. E isso não pode ser chamado de inteligência.

Antes dos haters aparecerem perguntando "E é errado que ela concorde com ele em alguma coisa?", vou logo esclarecer: Não significa que as mulheres não devam concordar com os homens, não é disso que esse texto trata, mas da forma como costumam categorizar uma mulher como possuidora de inteligência. 

Essa polarização de beleza e inteligência é extremamente frustrante, porque faz com que esqueçamos que as pessoas não se reduzem a uma característica única. As pessoas podem ter outras características ou talentos dignos de admiração, como coragem, ousadia, determinação, bondade, solidariedade, saber dançar, pintar, tocar um instrumento e etc. Muitas coisas podem tornar uma pessoa interessante para alguém. Essa idealização da mulher dentro de certas características é muito engessadora, pois tolhe a diversidade, a pluralidade. Exaltar outras características é garantir liberdade para que sejamos quem de fato somos.

Além disso, e principalmente,  esse esforço em reduzir o conceito de inteligência às afinidades de uma mulher ao pensamento de um homem é também uma espécie de Backlash. Pois, a mulher que é valorizada é aquela cujo pensamento se alinha ao status quo e é moldada por, e para, homens.  A liberdade da mulher é uma ameaça ao patriarcado, e ao mesmo passo ele reage, imputando-lhe a idéia de que não questionar é que é ser inteligente.

Para ilustrar, eu vejo muitas amigas postando por aí a seguinte imagem:


Sério, gente? sofrer calada? Sofrimento silencioso é muito conveniente para a manutenção de relacionamentos abusivos, por exemplo. Essa é uma idéia muito torta. Internalizar o sofrimento para não parecer emocional, não parecer que se importa e etc. Por que sofrer calada? Simples: Porque se não fizermos isso, seremos desqualificadas. Porque mulheres inteligentes não reclamam de homens. Alguém dirá que a imagem fala em sofrer com dignidade. Mas que dignidade é essa que nos silencia assim? Isso para mim tem outro nome: opressão.

No dia internacional das mulheres desse ano eu me perguntei: "Mas cadê os elogios às mulheres que subvertem a ordem? Mulheres trans, lésbicas, vadias, peludas, revoltadas, militantes, sindicalistas, abortistas, rebeldes com armas em punho? Essas se tornam invisíveis ao patriarcado, para essas não existem elogios."

E é exatamente disso que se trata essa manutenção da dualidade beleza versus suposta inteligência, se trata de não dar à mulher o direito à sua própria opinião, o direito de questionar e subverter. E rejeitar sistematicamente aquelas mulheres cuja forma de pensar, agir e viver se distancia de um ideal patriarcal de mulher.

20 comentários:

  1. Pra mim sofrer com dignidade deve ser igual a morrem bonito, cagar cheiroso...tipo sem nexo que nem a página mulher machista do facebook.

    Pergunta: Gizelli, é possível distinguir a pessoa vaidosa porque essa característica faz parte delx ou porque é sucumbente à um padrão de beleza? Ou é errada essa outra polarização que acabei de fazer? Ou o que? Me perdi.

    Tenho enorme dificuldade de enxergar essas coisas...

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    1. Anônima, vou lhe dar minha opinião por estar aqui, colocando um coments sobre o post. O útil, ao agradável.

      Nestas alturas do campeonato, não tem ninguém querendo 'distinguir' algo em alguém; tá todo mundo de olho no que a gente DEMONSTRA.
      Só se interessará em 'distinguir' algo em você, quem estiver interessada(o) em você...
      Por definição, vaidade é uma entrega que você faz, de seu caráter ou personalidade, a um padrão de beleza; caso não fosse o caso, você não estaria preocupada com isso, mas, com sua saúde por exemplo.
      De qualquer forma, você fez uma pergunta final, e é isso que vale!
      Você 'localizou' a pergunta num âmbito 'local': vaidade X beleza; a polarização enunciada está num âmbito mais universal: beleza X inteligência. No segundo caso, não há uma evidência de ligação 'expontânea'; como no primeiro caso.

      Bem, nem sei se meu pitaco será bem vindo...
      Inteligência e beleza, se não tiver aliada, conectada, em simbiose com o coração, vira um quase nada.

      Em tempo: se não houver no minimo um 'bom dia' em resposta aos meus comentários, não retornarei a este blog.
      A reciprocidade me alimenta.

      Bjs a todas.

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    2. Anônimo, eu acho que vaidade pode ser uma característica que faz parte, sim. Mas numa sociedade que exige tanto a beleza, acho difícil dizer o quanto dela não é apenas cobrança, entende?

      Ou seja, Acho que não tem uma resposta, "ou é X ou é Y", "ou é natural ou é construída", embora eu ache que se medíssemos em porcentagem, a maior parte seria uma vaidade construída.

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    3. Responder pelos outros nunca dá certo, a prova é a sua resposta: uma impressão pessoal, importante.

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    4. O problema que vejo na vaidade é porque ela é considerada muitas vezes uma coisa inerente do "feminino". Só se é mulher "de verdade" se é vaidosa. E essa vaidade se vincula ao padrão de beleza numa sociedade como a nossa e isso é uma merda.

      Mas a vaidade em si, aquela que não é condicionada nem aos padrões de beleza e nem ao gênero, não é necessariamente algo negativo. O problema é conseguir não condicionar a vaidade a esses itens numa sociedade como a nossa, né?

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    5. Essa exacerbação da vaidade, nas mulheres, já acho estranho. Beira a uma baixa estima generalizada. Mesmo sendo bonita, como minha filha é, com corpão, bocona, ela é uma refém do espelho quando vai sair.
      Interessante esta vinculação que você faz, é procedente.
      Vaidade é um sentimento comum a todos nós, mas, veiculado a padrões que a distorcem, ela não se torna saudável.

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  2. Bem, Gizelli...
    Como você já percebeu, ou não, fui conhecê-la em seu blog.
    Me obrigo a 'ver' a pessoa da qual estou lendo algo, aqui no Blogger.
    Você é bonita, e inteligente. Pago a maior por mulheres como você. Nunca namorei uma assim: bonita e inteligente ao mesmo tempo. Ou dei azar, ou não sou digno delas. Não me recusei a responder esta pergunta, até porque todas elas vêm com as respostas.

    Sobre o texto, sobre esta declaração DE Quem Você É...: muito bem escrito, claramente suas ideias são expostas, com maturidade, sapiência, delicadeza e..., frescor. Não ranço no que disse.
    Não vou debater, nem tenho razão para isso; li com atenção, sem pensamentos, sem julgamentos; direitinho como me ensinou Krishnamurti. Bem, não tão direitinho, mas o suficiente para ter percebido o alcance, e a verdade contida nelas.

    Fico contente de estar aqui, conversas como essas (quando escrevemos, conversamos, né?), me fazem muito bem.

    O prazer de conhecê-la, Grazielli, é todo meu.

    Abraços.

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    1. Mas o nome é Gizelli e não Grazielli, Sylvio. Mas sabe, quando penso em mim não vejo nenhuma dessas duas qualidades como preponderantes. Acho que você me viu assim exatamente porque é só isso que costumamos reconhecer nas mulheres, beleza ou inteligência, ou os dois juntos. Buscamos encontrar nelas essas características.

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    2. Lá em cima acertei, aqui em baixo lhe chamei por outro nome..., vai entender!
      Se suas ideias são emitidas com com 'maturidade, sapiência e delicadeza', é porque você tem essas qualidades, mais importantes que beleza e inteligência, que muitas vezes vêm atreladas a outras características, de caráter e personalidade.
      Quando olhamos uma pessoa não temos acesso as qualidades mais..., profundas.
      Visualmente, pela foto que vi em seu blog, você é bonita; quanto a inteligência, você a demostrou.

      Gizelli, longe de mim buscar somente essas duas qualidades, seria ingênuo de minha parte, e arriscado. Procuro nas pessoas, a priori, uma humanidade, sentimentos. O 'resto', é resto.

      Legal, a atenção que nos dispensou.

      Abraços.

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  3. Oi Gizelli, obrigada pela resposta ~não academicista~
    Na vdd o que me passou na mente qdo fiz a pergutna pensava naquela coisa do 'gosto pessoal' q a galerë usa pra justificar a 'prefência' por pessoas brancas. Tipo saber se eu tô repetindo uma coisa imposta... (não sei se fui feliz na comparação).

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    Sylvio, não leve a mal, mas não gosto de posts academistas e me pareceu q você meio quis me dizer como eu devo pensar, ou com o quê eu devo me preocupar. Confesso, não gostei. Senti um tom arrogante também.

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    1. Então, anônima (coloquei o "a" no final, por causa do obrigadA que vc escreveu, espero estar correta), Na minha opinião, que como você apontou, não é acadêmica, acho que o que vale para padrão de beleza, vale para vaidade, pois as coisas estão bem interligadas. Se estamos de alguma forma batalhando para entrar naquele padrão castrador, eurocêntrico e racista de beleza, de alguma forma, internalizamos essa opressão a ponto de reproduzí-la em nós mesmas. Então sim, acho que a vaidade está muito ligada à cultura (embora talvez não seja exclusivamente externa, pode passar por um questão pessoal também). Não que isso seja exatamente uma coisa ruim, pois somos seres que vivem em cultura, o problema é quando isso se torna opressor e excludente.

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    2. Está sim. Soy mujer. rs

      Só teve uma vez mesmo q vi esse padrão opressor se manifestar, assim VEEMENTE, quando uma colega me confessou que(ela usou exatamente essas palavras) 'não tem coragem de usar o cabelo in natura'. Fiquei triste porque acho q ela nem se deu conta que admitiu q usa o cabelo do jeito que a sociedade quer q ela use. E que ela não tem coragem de desafiá-la. :(

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  4. Peço desculpas, de fato fui 'academicista' e arrogante. Não fui feliz em minha resposta. Prestarei mais atenção.

    Abraços.

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  5. Concordo q existe essa tendência de "teleguiar" a mulher, lhe impondo uma forma de se portar, uma forma de pensar, sempre pressupondo uma concordância. Mas tem 2 detalhes: 1) inevitavelmente, pelo menos pra mim, uma mulher vai parecer mais inteligente no momento em q transcenda o pensamento médio, a espectativa, e parta para outras inúmeras áreas, entre elas aquelas q nem são tão consideradas "de menina". Não precisa nem concordar em nada, apenas o fato de surpreender ("curto ficção-cientifica", "amo rock progressivo") já dá um crédito a mais. 2) Acho q, ao lado da tal "supremacia do patriarcado", existem tb muitas mulheres dominadoras q não suportam o diálogo, o contraditório, querem q vc concorde com td sempre ou senão é chilique na certa. Pra mim isso é mais uma questão de personalidade, de pessoa pra pessoa, e nem tanto de "gênero" (palavra perigosa). Nem todo homem quer estar com alguém q concorde com td, q não proponha nada; ao mesmo tempo q muitas mulheres não toleram nenhum tipo de discordância, por mínima q for. Mas enfim, Gostei muito do texto, principalmente da parte do dia internacional da mulher. Bela sacada q eu ainda não tinha me tocado hehehe :)

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    1. Que transcenda o pensamento médio, mas continue na minha linha de pensamento, porque também não dá pra suportar essas mulherzinha q não concorda com nada, né?! Essas opressoras oprimidas, com personalidade carne de percoço. Claro.

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    2. Uma pena postares como anônima... Falas bem. Mas enfins, C'est la vie...

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    3. Olha oq eu disse, vou grifar pra tu ver: "e parta para outras inúmeras áreas, entre elas aquelas q nem são tão consideradas "de menina". Não precisa nem concordar em nada, apenas o fato de surpreender já dá um crédito a mais". Eu não posso querer q concordem sempre comigo pq eu não posso garantir isso tb, então tá de boa.

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    4. Me surpreenda (me prove)pra eu achar que você pode ser mais q um gênero, mulher!

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    5. Bom, sobre o primeiro tópico, vejo esse "fato de surpreender" apenas como uma outra forma do mesmo preconceito. Vejo hoje muitas garotas tão presas nesse conceito de ter de "surpreender" os homens quanto outras ao de seguirem os padrões valorizados pela mídia e o senso comum. Por que, especialmente entre os adolescentes, uma menina que gosta de rock é melhor que uma que curte MPB, forró ou até funk? É o seu esteriótipo que define seu nível de inteligência? Preferir um estilo a outro para si é normal, mas achar os que lhe tem os mesmos gostos são por algum motivo superiores aos demais é uma atitude extremamente imatura e, infelizmente, muito difundida na juventude de hoje.

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  6. Mulher de verdade vc chama de chata porque não quer ir para cama a toda hora e satisfazer suas ânsias sexuais (objeto sexual); piriguete faz sexo sempre que VOCÊ quer (objeto sexual de novo), ou seja, sempre satisfaz suas ânsias sexuais.Tipo, por que homem tem tanto problema em aceitar que mulheres gostam de sexo? Sexo tem que ser sempre para eles,nunca para gente. E mulher que gosta de sexo é piranha,logo vai te trair como você faria. Porque eu só posso achar que homens que pensam assim fazem julgamento baseado em seu próprio comportamento.Mas, tudo bem, eles são homens. Tão perdoados!! SÓ QUE JAMAIS!

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