"Uma cultura obcecada por magreza feminina não é obcecada pela beleza da mulher, mas sim pela obediência feminina. A dieta é o sedativo político mais potente na história da mulher, uma população levemente louca é uma população dócil". - Naomi Wolf
Enquanto a existência dessa data especial demonstra uma preocupação com os transtornos alimentares e suas vítimas, a sociedade continua a alimentar justamente o contrário que essa data prega: uma exaltação ao corpo magro, um incentivo às dietas e obsessões com o corpo inatingíveis. E é por isso que repudiamos a publicação da Revista Vogue intitulada "Comer pra quê? Fazer jejum está na moda. Saiba mais sobre a dieta da vez".
Irresponsável, prejudicial, lamentável é o mínimo que se pode dizer sobre essa reportagem que já no título tenta vender uma dieta que questiona a necessidade de comer. Dizer que ficar sem comer está na moda é glamourizar um sintoma frequente de anorexia e banalizar essa doença que atinge diversas pessoas, principalmente mulheres jovens. A nova tendência da moda é a de sempre: incentivar a busca por um ideal de corpo inalcançável, a qualquer custo. E a Vogue aprova e publica, mas sem esquecer de adicionar um "Só faça se tiver acompanhamento médico", como se adicionar essas palavras fizesse desaparecer a irresponsabilidade da publicação. Dizer que ficar sem comer dez dias do mês é válido é fazer uma campanha contra a saúde das mulheres.
O uso da palavra jejum para designar a dieta é fácil de relacionar com a ideia de penitência. A mulher é sempre condicionada a sofrer em nome de diversas coisas: por amor e pela beleza são as principais. Incentivar dietas altamente restritivas em nome de um ideal de beleza é colaborar com a ideia de que o sacrifício, por ambos, está ligado ao que é desejável para a mulher no patriarcado. A mulher que não se sacrifica é vista como desleixada e preguiçosa, coloca-se a dor e o sofrimento como uma motivação para a buscar ainda mais o ideal. E esse estigma não atinge só mulheres necessariamente, já que a sociedade vê todos que estão acima do peso como preguiçosos e trata de culpá-los e dizer que o sacrifício deles não é suficiente, alimentando ainda mais essa cultura de ódio a diversidade de corpos e sua consequência: oito milhões de estadunidenses (sete milhões mulheres) tem algum distúrbio alimentar. Um número incerto, visto que a maior parte das vítimas desses distúrbios não buscam tratamento e assim não fazem parte das estatísticas.
O uso da palavra jejum para designar a dieta é fácil de relacionar com a ideia de penitência. A mulher é sempre condicionada a sofrer em nome de diversas coisas: por amor e pela beleza são as principais. Incentivar dietas altamente restritivas em nome de um ideal de beleza é colaborar com a ideia de que o sacrifício, por ambos, está ligado ao que é desejável para a mulher no patriarcado. A mulher que não se sacrifica é vista como desleixada e preguiçosa, coloca-se a dor e o sofrimento como uma motivação para a buscar ainda mais o ideal. E esse estigma não atinge só mulheres necessariamente, já que a sociedade vê todos que estão acima do peso como preguiçosos e trata de culpá-los e dizer que o sacrifício deles não é suficiente, alimentando ainda mais essa cultura de ódio a diversidade de corpos e sua consequência: oito milhões de estadunidenses (sete milhões mulheres) tem algum distúrbio alimentar. Um número incerto, visto que a maior parte das vítimas desses distúrbios não buscam tratamento e assim não fazem parte das estatísticas.
Garotas veem mais de 400 propagandas por dia que dizem como elas devem aparentar. |
O corpo designado feminino é alvo de muito ódio: ele é objetificado, só valorizado se considerado bonito, o cheiro que advem dele é considerado ruim e os pêlos que o cobrem vistos como anti higiênicos. A sociedade aponta defeitos em nossos corpos o tempo todo. E esse incentivo insano à dietas é mais uma face dessa misoginia.
E a Vogue, junto com outros veículos midiáticos, diz que é necessário ser magra a qualquer custo o tempo todo. Dizem isso através de fotos e matérias que dizem que só a magra pode vestir as roupas daqueles editoriais, que apenas a magra é bonita e feliz, reportagens que incentivam dietas, propagandas "vendendo" remédios de emagrecimento como se fossem inofensivos ou dizendo "comer pra quê?". Enquanto isso mais e mais mulheres aprendem e continuam a se odiar e a pensar que o "qualquer custo" é um preço justo a se pagar.
E o Ativismo de Sofá repudia não só essa publicação, mas todas as que concordam com essa cultura de ódio.
Recomendo:
Guest post - Dia Internacional Sem Dieta, por Carol Marques no Eu que sou intolerante.
"Não sou gordofóbico, mas", Gordofobia vende e nós compramos e Saúde: o argumento velado da discriminação por Gizelli Sousa, A maior digressão do mundo.
A última dieta, Aquela Deborah
O propósito da mulher não é a beleza e Gordofobia: um assunto sério por Jarid Arraes
Transtornos alimentares são uma questão feminista por Carol Marques
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Muito bom seu texto :)
ResponderExcluirNão tinha conhecimento de que hoje comemora-se o "Dia Internacional Sem Dieta", infelizmente, fui conhecer a data após tomar conhecimento daquela matéria...
Também não conhecia o blog, vou retornar para ler as demais postagens.
Obrigada, Maura.
ExcluirEu tomei conhecimento sobre a data ontem também com uma postagem no Facebook de uma amiga. E resolvi falar sobre na hora de repudiar a matéria ridícula da Vogue. E hoje fiquei feliz de ver muitas pessoas falando que "O dia internacional sem dieta delas é todo dia" :D
Espero que continue frequentando o blog e gostando. :D
Apesar de achar o tema super importante e concordar plenamente com a reportagem, acho que o nome do dia pode levar à interpretações erradas (O Dia Internacional Sem Dieta) lembrando que muitas pessoas PRECISAM fazer dieta para viver (pessoas com alergias alimentares, diabetes ou usando determinados medicamentos). Essas pessoas podem se sentir mal ao verem tantas críticas á "dieta", sendo que é um modo de vida que elas não escolheram.
ResponderExcluirNão tinha pensado nisso, mas será que dá pra entender isso mesmo, sendo que a maior parte do que se fala do dia é acompanhado com questionamentos a respeito de o que é bonito?
Excluireu comentei até com a deborah sobre isso de dietas. existem dietas para pessoas anêmicas, para pessoas com problemas de saúde, dietas de ganho de massa magra, enfim, o jeito como a gente come é dieta. as dietas não são ruins. ruim é a imposição de uma dieta de fome, louca, só de folhas (oi, marisa), só de proteínas e sem base em nada profissional. isso de fazerem uma matéria inteira falando de uma dieta e, no fim, falar pra não fazer sem acompanhamento? tenha dó, né. tipo:"olha aqui como se faz, mas não nos responsabilizamos se der merda".
ResponderExcluirisso é criminoso. no meio de tanta gente com problemas sérios de anorexia e bulimia (eu mesma já tive), uma matéria dessas numa revista de moda como a vogue é pedir pra dar ideia errada pra quem já está fragilizada.
eu poderia falar um monte aqui, já que me interesso por nutrição, sigo, sim dietas (e passei a comer bem mais depois de ir ao nutricionista e emagreci com qualidade - perdi gordura, ganhei músculos)e sou saudável e feliz com isso. aliás, uma coisa que qualquer nutricionista sério diz é que, se vc tá passando fome, tá errado. passar fome é o primeiro sinal de que vc já começa a entrar num estado em que o corpo "come" músculos, pois já percebeu a privação. e isso não funciona. dietas corretas funcionam. dietas de fome nunca funcionam.
sobre o intermittent fasting, que é esse jejum, tem aqui um texto ótimo com depoimentos de mulheres que testaram e se deram mal. esportistas acostumadas a dietas para performance. vai desde ficar de humor péssimo a bagunçar o perfil hormonal a ponto de ter uma menopausa precoce. a quem interessar: http://breakingmuscle.com/nutrition/train-man-eat-woman
Obrigada, anônimx. É bem por aí mesmo, eu por exemplo sigo uma dieta bem restritiva, por conta de intolerância à lactose, anemia e refluxo. Não é fácil ser eu aheuaheuahuaeh, mas qdo leio essas reportagens vendendo a idéia de que é bom ficar sem comer, eu fico numa revolta só. Acho absurda a falta de responsabilidade, de sensibilidade e acima de tudo, de humanidade mesmo que vem embutida em tais artigos. É de uma violência simbólica indescritível.
ExcluirSerá que se fosse "Dia internacional sem regime" teria menos riscos de englobar as dietas por motivos de saúde?
ExcluirVou reproduzir aqui um texto que vi no facebook:
ResponderExcluir"A dieta e as revistas
Dieta se refere aos hábitos alimentares em geral, contudo, por causa de uma cultura de padrões estéticos opressores e estratégias de mercado, o termo teve seu sentido popular reduzido a regime alimentar restritivo, que visa exclusivamente à perda de peso e principalmente por causa disso, acaba sempre sendo associado a algum sacrifício com ausência de prazer na alimentação. Isso acaba sendo um problema maior nas publicações voltadas ao público feminino, já que as dietas das revistas masculinas são normalmente direcionadas ao aumento da massa muscular e diminuição de gordura, o que tende a ser mais saudável que as dietas de revistas femininas que prometem a maior perda de peso possível em um curto espaço de tempo. Perder peso e emagrecer são duas coisas diferentes. Emagrecer é diminuir o percentual de gordura. Uma dieta muito restritiva acaba levando a perda de massa muscular (o que diminui o peso na balança) e um nível de gordura igual ou maior que antes. A questão é: Para que emagrecer? Isso é mesmo necessário?
Algumas pessoas são saudáveis com um peso que seria demais para outras, em outras palavras, algumas pessoas podem ser gordas ou muito magras sem que isso lhes traga prejuízos à saúde, enquanto outras não. Acontece que só olhando, é impossível dizer se a pessoa está saudável ou não, até mesmo para um médico.
Começando pelo fato de que ninguém deveria impor regras ao corpo de ninguém e todo mundo tem o direito de querer não levar uma vida saudável, esta imposição acaba sendo mais sórdida, porque acaba indo na contramão do que faz bem a saúde, para buscar um padrão de beleza inatingível e que deve permanecer assim, porque uma vez inalcançável, serve de estímulo para uma cultura de consumo de produtos que prometem uma maior aproximação deste padrão, num ciclo que não acaba nunca. Pior ainda é a dieta ser vendida como sacrifício temporário para se atingir o “corpo ideal”, onde o “efeito sanfona” é inevitável. Isso contribui no agravamento de distúrbios alimentares como bulimia, anorexia e vigorexia.
Junto a isso, temos os interesses da indústria da alimentação ruim (pobre em nutrientes e rica em gorduras trans e/ou conservantes químicos), que propaga a ideia de que comer fast food é prazeroso e se alimentar bem é sempre um sacrifício. Até a indústria da moda faz isso, como no caso da propaganda das lojas Marisa onde o ato de comer alface (tendo como único objetivo o emagrecimento), além de ser colocado como fardo, é tido como necessário para usar as roupas da própria loja.
Isso tudo acaba gerando um impasse sobre o papel da alimentação dentro do nosso próprio processo de emancipação, como se precisássemos escolher entre ter uma vida feliz ou saudável, já que em teoria, as duas opções seriam incompatíveis. Mas será que são mesmo? Ao mesmo tempo em que se libertar dos padrões estéticos fortalece a auto-estima, se libertar aos poucos de uma indústria que vende o auto-envenenamento diário como forma de felicidade também pode ser gratificante. Comer o que alimenta pode ser muito prazeroso quando conseguimos perceber a resposta positiva que o corpo nos dá. Fazer isso pela própria saúde é muito menos penoso do que prejudicar a própria alimentação para se enquadrar num padrão que agrade mais os olhares alheios. Na dúvida, consulte um nutricionista."
Sou formada em Educação física, e professora de musculação, e sério, me dá vontade de chorar quando vejo uma matéria dessas.
ResponderExcluirA maioria das meninas e mulheres que chegam pra mim, deveriam primeiramente procurar um tratamento psicológico, porque elas querem tanto atingir um corpo ideal, estão tão focadas nisso, fazem tantas dietas, que acabam se isolando do mundo, elas não vão a uma festa de criança pra evitar comer besteiras. É uma absurdo.
Obviamente, eu como sendo educadora física, defendo a pratica de exercícios físicos, mas não para se atingir um corpo perfeito e bonito para o verão, mas sim, pela saúde, se as pessoas praticassem atividade física e se alimentassem pensando nisso, na saúde, o corpo "bonito" (o que é muito relativo) vem como consequencia. Pratico atividade física e tento manter um estilo de vida saudável, até porque pelo meu trabalho, penso que devo dar exemplo e me sinto bem assim, mas sem grandes pressões, tem semanas que me dá a louca e como umas porcarias muito boas, e sem peso na consciência, ahahaha. E estou looonge de ter o corpo de uma modelo, ou panicat (que são os corpos tidos como perfeitos por essas mulheres), e nem quero isso pra mim.
E como no comentário acima, mesmo eu sendo educadora física, não posso obrigar ninguém a ter um estilo de vida saudável, eu oriento e só. Infelizmente no meu meio sou minoria. A maioria dos professores, principalmente de academia, incentivam esse tipo de pensamento de que a mulher tem que ser magra.
É triste isso tudo, é triste as mulheres não se aceitarem como são, é triste elas se obrigarem a comer algo (ou não comer) pra ficar magra pra agradar aos outros, é triste elas chegarem na academia onde eu trabalho, treinar dez minutos e desmaiar porque estavam em jejum a mais de doze hroas achando que emagreceriam.
Falo por experiencia propria, a partir do momento em que elas se aceitarem, a pratica de atividade física e dieta saudável (e saudável mesmo, comendo bem a cada três horas) não seria mais um sacríficio para elas, e não achariam um crime comer uma porcaria, ou deixar de treinar um dia ou uma semana que seja.
Ah, e sabe o que mais eu vejo na academia onde trabalho? Foge um pouco do teu post, mas também é sobre padrão de beleza, mas enfim. As mulheres bem musculosas, bração e tal, os homens não aprovam, acham masculinas demais, eles aprovam mulheres com aparência mais frágil.
ResponderExcluirMais uma vez, é triste.