Essa semana, mais um caso de violência contra a mulher foi assunto comentado nas redes sociais e blogs feministas. Trata-se do abominável estupro coletivo, que ocorreu em Queimadas, na região do agreste Paraibano. A polícia prendeu dez homens acusados de estuprar seis mulheres e matar duas delas.
O caso em si já é horrível, mas os detalhes são ainda mais cruéis. Luciano Pereira dos Santos comemorou o seu aniversário com uma festa, seu irmão, Eduardo Pereira dos Santos, convidou as mulheres que seriam as vítimas do crime que planejaram: Alguns homens armados e encapuzados invadiram a festa e separaram os homens e mulheres em cômodos diferentes.
Nesse ponto, as vítimas foram vendadas. Luciano e Eduardo se vestiram como os bandidos e estupraram seis das oito mulheres presentes na festa (excetuando-se apenas a esposa e a namorada de Luciano e Eduardo, respectivamente). Enquanto eram violadas duas vítimas reconheceram os estupradores e por isso foram assassinadas. Os dois rapazes chegaram a ir ao enterro das jovens, mas foram presos ali mesmo, na frente das famílias.
Ao se deparar com uma notícia tão chocante, a primeira reação da sociedade é chamar a estes homens de monstros ou animais, atribuir-lhes a pecha de selvagens. Não discordo de todo que há pouca civilidade neles, o problema é que as pessoas tem essa idéia que o criminoso é alguém distante, alguém que jamais conseguiria viver em sociedade. Ignoram que a crueldade é bem típica do ser humano, em todos os lugares do planeta. Chamar o criminoso de monstro é alegar que homens não cometem crimes tão cruéis, sendo que todos nós fazemos parte de uma cultura que estimula homens e mulheres a perpetuarem a violência contra a mulher em diversas modalidades, seja estupro, violência doméstica física ou psicológica.
Retirar dos criminosos da Paraíba, e de todos aqueles que agridem as mulheres, suas características humanas exime o homem comum da culpa de toda a violência simbólica que ele comete. Ao fazer isso ignora-se que há toda uma cultura que contribui para a idéia de que a mulher é um objeto, que não pode decidir por si e, no caso de Queimados, a situação é tão flagrante que a mulher é oferecida como um presente de aniversário. Especula-se inclusive que o estupro foi armado porque uma das mulheres teria recusado um dos estupradores. Ou seja, a mulher não pode ter opinião.
A alegação de que os criminosos são monstros/animais ignora que a violência de gênero é um problema estrutural. O machismo e a misoginia não são "doenças individuais", são problemas sociais. Não é coerente achar que está tudo bem rir de piadas que envolvem estupro, como aquelas feitas por Rafael Bastos ("estuprador de mulher feia merece abraço") ou Danilo Gentili ("esperar a mulher ficar bêbada demais pra dizer "não" é coisa de gênio") e depois chocar-se com notícias de violência contra a mulher.
Uma sociedade que aplaude uma piada de estupro, culpabiliza a mulher quando estuprada por causa de seu comportamento sexual e suas roupas, uma sociedade que vê o estupro como um vacilo da mulher e uma oportunidade para o homem é uma sociedade que produz crimes bárbaros, mas toda essa barbárie não é fruto de um monstro ou de um animal. É fruto de um ser humano que conhecia as vítimas e que agiu como se as mulheres fossem apenas meros objetos.
Na verdade, é uma contradição, afirma-se que o agressor é um animal, um monstro, um louco, um predador, atribuindo a este o instinto em vez da racionalidade, mas ao mesmo tempo, quando observamos todo o planejamento em volta do crime, podemos dizer que na verdade, eles foram frios ou calculistas.
O que realmente choca, é que tivemos três casos em evidência na mídia: O estupro no BBB12, o julgamento de Lindemberg Alves (algoz de Eloá Pimentel) e o estupro coletivo na Paraíba. E em nenhum dos três casos a grande mídia usou os termos "misoginia", "machismo" ou "feminicídio". O Estupro do BBB, nas palavras do Rei (por mim, deposto) Roberto Carlos, virou "brincadeirinha". O assassinato da Eloá, virou crime "passional" ou como a advogada de Lindenberg prefere chamar "uma decisão errada". E o crime de Queimadas, "uma monstruosidade". Assim, ninguém encara o que realmente acontece e nem toma parte na sua própria culpa ao incentivar o machismo cotidiano.
Escrito por Gizelli Sousa, com a co-autoria de Thaís e Elisa para a Blogagem Coletiva organizada pelas Blogueiras Feministas.
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Gizelli TE AMO <3
ResponderExcluirAmanda.
gostei muito do texto gizelli,é bom ver que outras pessoas tem a mesma perspectiva que eu tenho.hoje mais cedo comentei em um site que falava sobre o "caso de queimadas" e tentava colocar no texto exatamente o mesmo pensamento que você colocou no seu...só não concordo com sua opinião sobre o caso do BBB,em que a propria mulher disse ter sido uma troca de carícias consensual...mas a partir de agora vou procurar outros textos seus para que possamos conversar se for o caso... mateus alves...
ResponderExcluirObrigada :)
ExcluirEstou à disposição.
Acho bem provel que o assassino da Eloá seja um homem machista, mas reduzir este crime a isso acaba sendo muito simplista. A falta de avaliação em relação as consequências do crime na vida de quem o praticou, assim como a maneira com que ele foi praticado, são claras evidências de comportamento obssessivo, o que acontece com homens e mulheres. Se uma mulher mata o ex por não aceitar o fim do relacionamento poderia ser chamado de femismo? (quero frisar a diferença entre femismo e feminismo). Em relação ao caso do BBB, o andamento do processo e as declarações da suposta vítima transformam qualquer acusação de estupro em especulação. Todos são inocentes até que se prove o contrário e não se provou o contrário, o caso foi encerrado e a moça disse que foi concensual. No caso do estupro coletivo, concordo plenamente com vocês
ResponderExcluirSimplista pra mim é não reconhecer que socialmente falando há muitos fatores que influenciam o cometimento de crimes como o do caso Eloá. A nossa cultura tem vários viéses que acabam por fazer crimes contra mulheres acontecer.
ExcluirMesmo quando uma mulher mata um homem por ciúme, crime raríssimo em comparação com o contrário, muito do patriarcado influenciou nesse crime, porque é o patriarcado que coloca relacionamentos cheios de posse como algo natural.
Já o caso da BBB, bom, a gente tem que pensar que estupros, principalmente de vulnerável, são extremamente subnotificados porque há uma aspectos culturais que fazem que a vítima se sinta culpada.
Márcia, acredito que você ignora muitos fatores sociais e só quer analisar crimes e condutas de forma individualizada que ignora que há influências externas no comportamento humano que são a cultura e afins.