A princípio quero deixar claro que falo de maternidade por ponto de vista particular. Mas acredito que esse texto se encaixa na questão da parentagem em geral: pais, mães, parturientes ou não, enfim, todo tipo de família, nas relações que criam ao longo da convivência com xs filhxs.
Ser mãe é um tesão. Começo com essa frase porque é exatamente como tenho me sentido diante da maternidade. Com aquela excitação de quem está conhecendo partes de si mesmx até então, sabe? Enfim, um tesão.
Diante de uma etapa complicada, não planejada e revolucionária da minha vida tenho procurado muita coisa para me informar. Artigos, livros, isso e aquilo que me ajudem a compreender o assunto. Dentro disso descobri uma corrente muito forte de “ensinamento” e disciplina da maternidade e da criação dos filhos. Tolerância ao choro do bebê, necessidade de “independência” (sim, independência de um bebê, pasmem!), desapego e castigo são alguns dos pontos fortemente estimulados por esse segmento.
Nossa sociedade, apesar de apontar a maternidade como algo praticamente obrigatório, não nos permite o exercício pleno desta. A “civilização” não permite que nos vejamos como mamíferas, não podemos agir como os animais que verdadeiramente somos e, por consequência, não aproveitamos a maternidade da forma que desejamos. Afinal, prega o grupo dos civilizados que tal fase deve vir de maneira planejada, racional, e serve para nos “criar juízo”, não nos deixar mais loucas.
A repressão ao sentimento materno é muito parecida com o controle da sexualidade feminina. Querem nos dizer exatamente o que fazer e como fazer. Afinal, ninguém nega que se deva fazer sexo, mas só depois do terceiro encontro, só entre duas pessoas, só dentro do quarto, só em tais posições, só com pessoas do “sexo oposto” (e ai de quem não se enquadrar nas categorias de sexo predefinidas)... Enfim, o exercício da nossa sexualidade é lotado de regras e comportamentos considerados adequados. Não podemos dar ouvidos aos nossos desejos mais secretos, nossos instintos, às vontades particulares de nosso paladar e tato ou somos consideradas imorais. Ouvir mais nosso corpo e mente do que aos outros é um ato pecaminoso e socialmente inaceitável.
Por conta disso nem nós mesmos conhecemos e desenvolvemos nossas reais vontades. A sexualidade é sufocada a tal nível que não naturalizamos nossos desejos. Por mais que existam, sempre serão vistos por nós como errados. O mesmo acontece no exercício da maternidade. A forma de ser mãe está cercada de regras, de maneira que não nos permitimos no contato com a cria desenvolver nossa sensitividade e o retorno ao nosso estado mais primitivo que nos colocaria em um constante estado de comunicação não-verbal com nossxs filhxs.
Somos ensinadas a não aceitar o choro dx nossx bebê, a focar em sua disciplina. Uma mãe não deve pegar a cria ao colo toda vez que esta chora, também não deve dormir na mesma cama, deve desmamar porque afinal “criança andando que ainda mama é muito feio” (por mais que a Organização Mundial da Saúde diga o contrário), deve voltar a trabalhar após quatro meses e deixar a criança na creche... Milhares de regras que nos dizem o que devemos ou não sentir frente à situação de ser mãe.
É claro que não nos perguntaram se preferimos deixar que nossxs filhxs chorem no berço a pegar-los no colo e fazer carinho, também não interessa se gostamos de dormir e tomar banho com elxs. E se a maioria das mães se sente culpada por voltar a trabalhar tão cedo (por favor, que licença-maternidade é essa?) já dizem que é por estar apegada demais. Não considera pensar que simplesmente a mulher em questão pode preferir estar com x bebê?
A maternidade selvagem é reprimida tanto quanto a sexualidade feminina. Vivemos uma sociedade que acredita ser civilizada demais para praticar orgias e amamentar xs filhxs até a idade que elxs quiserem. A pressão social nos sufoca e quer nos ensinar a sentir, de forma que não ouvimos nosso corpo e intuição não podendo aproveitar assim o melhor de nós mesmxs.
Bem como o sexo é pessoal, cada mãe deve se permitir desenvolver, ao longo da convivência com sua cria, um jeito singular de comunicação e compreensão das necessidades e desejo de ambos. Para que cada mulher possa aproveitar a maternidade da maneira que desejar. Com apego, com carinho, com amor.