sexta-feira, 25 de abril de 2014

Moça, a culpa não é sua.

*Trigger warning. Texto de conteúdo potencialmente incômodo.



Moça, hoje eu escrevo para você. Sei que muitas vezes você ouviu que a culpa foi sua, que você poderia ter evitado, mas esse texto quer passar uma mensagem muito diferente dessa que todas nós estamos cansadas de ouvir (ou ler). Sei que talvez você ouviu culpabilizações de alguém bem próximo em que você confia/confiava e que você contou o que aconteceu esperando uma palavra de apoio e um abraço e quando esse apoio não veio, você sentiu o peso dessa culpabilização recair em você e acreditou que foi culpa sua. Sei que talvez você não tenha acreditado por completo, mas ainda assim, se sente culpada.

Moça, acredite em mim, acredite em nós, você não tem culpa alguma. Ao contrário do que te disseram, seu short curto, sua calça justa, o fato de você ter bebido, o caminho que você percorreu, nada disso faz com que a culpa seja sua. A culpa é do agressor. A culpa é do estuprador. 

Moça, o corpo é seu e seus sentimentos, suas vontades e suas escolhas importam. A culpa é de quem ignora seu não e passa em cima do seu consentimento. Moça, lembre-se, a culpa não foi sua.

Moça, eu não me esqueci de você que sofreu violência do seu parceiro e esteve em um relacionamento abusivo e ouviu que a violência que você sofria foi causada por você. Você não tem culpa, moça. E eu sei que talvez você pode ter ouvido isso de policiais, mas o fato deles serem policiais não transforma o que eles disseram em verdade.

Moça, não tem nada de errado em tirar fotos nuas e filmar momentos íntimos. O que é errado e criminoso é divulgar essas fotos e o vídeo sem o seu consentimento. A culpa não é sua. Sei que estão te ofendendo e te culpando, mas a culpa é de quem violou seu direito à intimidade. 

Moça, talvez você tenha ouvido ou lido que o seu sofrimento é um exagero e eu sinto muito por isso, mas além de culpar a vítima, o machismo e a misoginia também faz questão de desmerecer a voz das mulheres que sofreram violência ou estão sofrendo para silenciá-las. E a forma que eles tem de desmerecer é banalizar diversas agressões e duvidar dos relatos de violência.

Moça, a culpa não foi sua, quando você foi encoxada no metrô. Você tem direito à cidade, você tem direito a utilizar o transporte coletivo sem sofrer violência sexual. A roupa que você usava no momento não importa, você não teve culpa disso ter acontecido.

Moça, a culpa não é sua. E nós estamos aqui para te lembrar disso quantas vezes você precisar. Estamos aqui para ouvir você, estender a mão para você e oferecer nossa solidariedade para que você se empodere.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Vivência não monogâmica para mulheres

Alerta: esse não é um texto heteronormativo. Mas, a situação relatada ocorre, predominantemente, em relacionamentos entre homens e mulheres. 


Eu sei que existem pessoas que desconhecem a não monogamia como um modo de se relacionar afetiva/sexualmente. Não há unanimidade nem mesmo nos moldes de relacionamentos entre quem pensa que a monogamia não é uma opção. E sei que há um grande grupos de pessoas que rechaça a ideia que a ausência de exclusividade pode trazer em uma relação. Essa postagem não trata dessa situação como escolha ou compulsoriedade. Ela fala de violência.

Se você é mulher não monogâmica, já deve ter sentido o peso dessa subversão. O julgamento inicial que o patriarcado proporciona é de que você compõe o grupo de mulheres vadias que não merece nenhum respeito. Um carimbo de que não é mulher séria, que não merece casar (mesmo que muitas de nós não esteja interessada), de libertina.

Entenda, eu não tenho absolutamente nada contra a liberdade sexual das pessoas. Liberdade de fazer sexo por sexo. De querer sexo descomplicado (o tal “sexo fácil”). De desvincular romantismo desse assunto. Não falo do medo moralista da expressão “libertinagem”. Sem higienismo. Liberdade engloba tudo isso aí.

Eu presumo que desses julgamentos você já saiba se proteger. É da sua natureza livre.

O problema é quando aquele homem, que se afirma seu aliado na contestação da monogamia, que está ali pra caminhar do seu lado, te impõe uma série de regras de comportamentos para que você seja alocada na casinha das libertárias. Ele vai te julgar por não querer alguma prática. Ou vai te condenar por dizer não. Te chamar de frígida talvez, pode até questionar sua autenticidade no movimento. Ele vai tentar te diminuir até que você diga sim. 

Deveria ser obrigatório, antes de adentrar em meios não monogâmicos, que o homem tivesse noções de feminismo. Que soubesse que a monogamia foi uma imposição para controlar a sexualidade da mulher com o intuito de assegurar a transmissão da propriedade aos seus. Eu acredito que amenizaria as reclamações, recorrentes, de companheiras assediadas sob essa alegação. Mulheres que tiveram seus corpos e sua integridade desrespeitada.

Mulher, se empodere! Use as armas que o feminismo lhe trouxe. Não permita que te imponham conceitos equivocados sobre liberdade, que ditem o que você deve ou não fazer, que te empurrem uma validação dispensável.

Sexualidade compulsória é violência, sabia? Das bravas. Boicote os assimilacionistas.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Representatividade importa

Fonte

Quando o assunto é representação midiática, vários grupos militam para que essa representação seja mais plural, enquanto uma parcela de pessoas despreza a importância dessa pluralidade e afirma que os programas de televisão e os filmes ao não representarem pessoas negras e gordas, lésbicas, gays, bissexuais e pessoas trans não mudam nada na vida dessas pessoas. Faço parte do grupo que luta por uma melhor representação midiática e que reconhece a importância dela como ferramenta para empoderamento de pessoas. 

O problema da representação não se restringe a criticar a ausência de pessoas de grupos diferentes na mídia, mas também trata de criticar as representações problemáticas que são baseadas em estereótipos de gênero, de raça e que são flagrantes discriminações. Nesse aspecto, se luta, por exemplo, por uma representação feminina que não seja simplesmente a versão "feminina" de personagens masculinos. Ou seja, que as personagens femininas tenham aspectos de personalidade como personagens masculinos tem, que elas não sejam simplesmente resumidas a estereótipos de gênero. 

Numa sociedade heteronormativa, representações de casais não héteros na ficção são importantes em vários aspectos, entre eles, naturalizar as relações não hétero para a sociedade em si. Fazer com que as pessoas encarem dois homens andando de mãos dadas e namorando, assim como encaram o casal formado por um homem e mulher. A novela "Em família", ao colocar duas mulheres como um possível casal e tratar da relação delas de amor, descobrimento e de amizade, de certa forma faz isso. Já vi críticas e elogios sobre as personagens da novela, mas vale a pena ler esse relato, que é, por sinal, o motivo que escrevo esse texto, porque através dele fica fácil perceber a importância da representatividade:

"Minha vó é uma senhora de 87 anos que todo dia assiste novela e gosta bastante de conversar sobre o que aconteceu no capítulo do dia. Esses dias, vi um trecho da atual novela "Em família" com ela. Nessa novela, tem duas personagens chamadas Clara e Marina. Clara é casada com um homem e Marina é uma fotógrafa super talentosa e que é lésbica e as duas ficaram amicíssimas. Marina se interessa por Clara e Clara começa a se descobrir apaixonada por Marina também. Nesse contexto, minha avó me contou que quando era novinha, ela tinha uma amizade muito grande com uma moça, ambas faziam tudo juntas, se acompanhavam e se apoiavam, como as moças da novela. E essa amiga, quando começou a namorar, se afastou dela e ela contou que ficou arrasada por isso, muito triste mesmo. E disse, de forma muito leve, que ela talvez tenha sido apaixonada por essa amiga dela, como as moças da novela e que só não sabia disso porque na época ela sequer sabia que existia casais de mulheres. Fiquei emocionadíssima, assim como minha mãe, ao ouvir aquilo." - Relato adaptado a pedido da enviante


Bons links:

Podcast do We Can Cast it!:
Documentário:
Vídeos:
Feminist Frequency (Há vários vídeos sobre o assunto nesse canal, mas selecionei esse específico. É possível habilitar legendas.) 
Textos: